A procura da felicidade
A cada dia, é maior o número de pessoas que acham “errado” se sentirem tristes e que por isso buscam medicamentos para tratar essa “doença”.
Hoje, como faço todas as segundas-feiras, tirei um tempo do meu dia para ler a coluna semanal de Eliane Brum, e passei o resto do dia refletindo sobre o que li.
O texto fala sobre como a atual postura da sociedade de que todos temos direito à felicidade tem nos causado mais sofrimento do que alegria. A cada dia, é maior o número de pessoas que acham “errado” se sentirem tristes e que por isso buscam medicamentos para tratar essa “doença”. Nas palavras de Eliane:
É um tanto fascinante os caminhos pelos quais a felicidade vai deixando o plano das aspirações abstratas, da letra dos poetas, para ser tratada em consultório médico. E, ainda mais recentemente, como objeto do Direito e da Lei, inclusive com proposta de emenda constitucional.
Lendo o artigo, não pude deixar de pensar em todos os meus amigos e familiares que já tomaram remédios para controlar a ansiedade ou antidepressivos em ao menos alguma época de suas vidas. Será que o tratamento era mesmo necessário em todos os casos? Ou também eles sucumbiram à Ditadura da Felicidade?
A psicóloga Rita de Cássia, entrevistada pela jornalista na matéria, explica que a psicanálise apelidou esse momento que o mundo vive de a era do direito do gozo:
Vivemos em uma época que não trata a felicidade como algo a ser construído ou conquistado, mas sim como um direito.
Ao longo da entrevista, Rita descreve como hoje, além do próprio sofrimento, as pessoas sofrem pelo fato de estar sofrendo, “como se não tivessem mais o direito de ficarem infelizes”.
Mais preocupante ainda é o número de pessoas que preferem um tratamento que as faça calar em vez de falar:
Num passado não muito distante o profissional da saúde mental era, em geral, procurado para ajudar a pessoa a compreender seus mal-estares, decifrá-los. Hoje, um número cada vez mais crescente de pessoas nos procura com um único objetivo: se livrar dos mal-estares. Não querem saber nada sobre seus sofrimentos ou sobre sua infelicidade, não desejam decifrá-los ou interrogá-los. Querem apenas que o sofrimento e a infelicidade silenciem, e ainda demandam de nós uma resposta rápida, eficaz e, especialmente, que não lhe exija muito esforço.
E é nesse instante, quando entramos no aspecto do “sem esforço”, que o problema fica ainda maior para a que já é naturalmente considerada a geração do “eu mereço”:
Temos tratado nossos filhos como se fossem peças de louça muito delicadas. Ao condená-los à felicidade ampla, geral e irrestrita, estamos produzindo uma geração de jovens extremamente frágeis e imaturos, que se quebram ao menor arranhão.
Eu já havia falado sobre a falta de preparação da geração Y no post A vida é para os insistentes, mas o texto Permissão para ser INfeliz me fez perceber que todas as gerações estão de certa forma mais despreparadas e que, ao encararmos a infelicidade como “doença”, perdemos um pouco de nossa própria humanidade.
Há um trecho do filme À Procura da Felicidade de que gosto muito. Nele, o personagem principal, Chris Gardner, reflete sobre o motivo de a Declaração de Independência dos EUA ter assegurado o direito à vida e à liberdade, mas não à felicidade em si, e sim à sua busca:
Talvez porque a felicidade seja algo que podemos apenas perseguir, mas nunca ter de fato.
Eu acho que é isso. Que devemos todos voltar a buscar a felicidade, como uma meta que nos motiva a fazer coisas extraordinárias para alcançá-la.
E para aqueles que tiverem receio de suas próprias tristezas, eu os deixo com uma frase de Rubem Alves:
Há muita beleza escondida na sua tristeza. Não tenham dó de si mesmos. Tratem de usar o martelo e o cinzel…”
(Para entender a referência ao martelo e cinzel, vale a pena ler o artigo E a pedra continua pedra).